Legado: o desafio dos grandes eventos esportivos

Quando planejado e realizado adequadamente, um grande evento esportivo pode proporcionar ao país ou à cidade sede a oportunidade de se promover globalmente, aprimorar o perfil econômico e transformar a infraestrutura urbana e desportiva. Por Charles Schramm*
Charles Schramm sócio da KPMG no Brasil

Por outro lado, é inquestionável que as complexidades para sediar uma competição aumentaram exponencialmente nos últimos anos. A imensa quantidade de atletas, suas necessidades, as demandas da mídia, as expectativas do público e as orientações e os critérios técnicos apresentados pelas federações internacionais, pelos órgãos reguladores e pelos detentores de direitos contribuíram para colocar um peso ainda maior de preocupações sobre o anfitrião.

Esses fatores citados potencializaram o custo da preparação e o valor dos investimentos necessários para a organização atender aos requisitos de todas as partes envolvidas. Dessa forma, as questões relacionadas ao retorno financeiro de sediar um evento estão cada vez mais em pauta.

É evidente que qualquer competição de nível mundial causará impactos sobre o local, mas estes podem ser, com grande frequência, negativos diante da falta de planejamento. E é com o objetivo de provar que sediar um evento traz benefícios a longo prazo que o termo “legado” vem sendo altamente utilizado.

Diante disso, surgem cada vez mais evidências de que os pontos de aprendizado, a partir de grandes eventos esportivos anteriores estão sendo incorporados pelos licitantes e pelos organizadores. Em uma era de intensas verificações dos investimentos feitos por órgãos reguladores e de uma visibilidade na mídia, participar de uma licitação para sediar uma grande competição que requeira a construção de um estádio, uma arena, um velódromo, um centro aquático ou uma pista de corrida pode ser difícil de ser justificado. Isso é verdade, especialmente, quando a possibilidade de atrair investimentos do setor privado é limitada. Nesse contexto, uma estratégia clara de legado para os locais onde acontecerão as competições, baseada em um entendimento das tendências de mercado após o evento e das instruções detalhadas de elaboração e planejamento, é de extrema importância para garantir o impacto positivo.

Dessa maneira, é extremamente importante estar atendo a alguns sinais que podem direcionar e indicar o sucesso do evento e seus benefícios para a sociedade. Primeiramente, é essencial aprender com a experiência. Com um número cada vez maior de especialistas, os quais possuem conhecimento e vasto know-how comprovados, os licitantes têm acesso a uma ampla gama de consultores que podem ajudá-los a maximizar o impacto de eventos específicos.

Também é importante pensar em utilizar as boas novidades que o aperfeiçoamento dos serviços oferece. Soluções temporárias estão cada vez mais sendo consideradas como uma alternativa condizente com a realidade no que tange à construção de locais permanentes não desejados. Os avanços em aspectos técnicos estão em um nível tão elevado que ter uma experiência em uma disputa realizada dentro de uma estrutura temporária não pode mais ser considerada inferior à que se teria em um local de eventos permanente. Os especialistas do setor acreditam que componentes modulares desempenharão um papel cada vez maior, trazendo um conjunto de vantagens significativas, incluindo a possibilidade de tais locais serem reutilizados e/ou reciclados após o evento.

Ao mesmo tempo, é preciso levantar questões em relação à postura dos detentores de direitos. Iniciativas, como a Pauta Olímpica 2020 do Comitê Olímpico Internacional (COI), estão incentivando e esclarecendo a crescente importância do legado para os órgãos desportivos influentes. Outros detentores de direitos também demonstram valorizar a utilização do local para a sustentabilidade a longo prazo da infraestrutura desportiva. Entretanto, será interessante observar se os detentores de direitos e as federações internacionais estão dispostos a seguir em frente, talvez mostrando maior flexibilidade em relação aos requisitos técnicos, passando a envolver-se mais no processo de tomada de decisão a respeito de qual tipo de local deve ser construído, ou demonstrando um envolvimento potencialmente maior na estratégia pós-evento dos locais utilizados.

O resultado do surgimento do “legado” é que as discussões e soluções em relação ao tema devem ser tópicos constantes e proeminentes nas pautas de todos os licitantes e organizadores. Em termos de locais para a realização de eventos, é dever das partes interessadas apresentar uma estratégia clara, baseada em um entendimento das condições de mercado nas quais provavelmente operará quando a competição tiver sido concluída e com uma solução de legado colocada na dianteira da fase de planejamento de uma infraestrutura desportiva.

*Charles Schramm é sócio da KPMG no Brasil