Revogação do PERSE – da ilegalidade e inconstitucionalidade

Alessandro Ragazzi é advogado, sócio da RAGAZZI ADVOCACIA, e especialista em assuntos jurídicos voltados ao setor de ventos, além de diretor jurídico da Associação Brasileira de Cenografia e Estandes (ABRACE)
Alessandro Ragazzi, advogado

Duríssimo golpe! Toda a luta travada pelo setor de eventos, que culminou na criação do PERSE (Programa Especial de Recuperação do Setor de Eventos) foi simplesmente esquecida pelo Governo Federal.

Mais que um desrespeito, a atitude governamental foi sorrateira. Ao apagar das luzes de 2.023, mais precisamente no dia 28 de dezembro, o Governo Federal (leia-se “Presidência da República) Edita a MP 1202, que, entre outras barbaridades, simplesmente cancela o benefício da alíquota zero para os tributos federais, para todo o setor de eventos.

Aqui, como advogado e defensor da ciência jurídica, devo manifestar-me no seguinte sentido:

Em primeiro lugar, a revogação do benefício afeta diretamente o princípio da “segurança jurídica”, que prevê a estabilidade das relações jurídicas, entre elas a jurídico tributária. Ora, estamos diante de um benefício fiscal concedido por “prazo certo e determinado”.

Milhares de empresas fizeram seu planejamento considerando a realidade legislativa, votada e aprovada pelos representantes do povo brasileiro.

Em segundo lugar, a referida MP ofende diretamente o artigo 62 da Constituição, que prevê que referidas normas apenas podem ser editadas em caso de “relevância e urgência”. Ora, como sustentar a “urgência” da medida, tendo em vista as anunciadas revogações, para abril de 2.024 e janeiro de 2.025 (quando os benefícios cessariam, nos termos da citada Medida provisória).

Em terceiro lugar, entendemos que a nova norma fere também o princípio da legalidade, por clara ofensa ao artigo 178 do Código Tributário Nacional, que dispõe:

“Art. 178 – A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104.”

Ora, a Lei que concede a chamada “alíquota zero” não pode ser desconsiderada como uma norma de “isenção”, na medida em que acarreta as mesmas consequências jurídicas.

Como tal, a lei do Perse estabeleceu benefício claro e por prazo certo e determinado, condicionando a fruição do mesmo ao cumprimento de certas características (CNAE´s específicos e prazo de início de atividade).

Assim, antes de findo o prazo de isenção (alíquota zero) não pode nova norma legislativa alterar a referida regra, sob pena de ofensa ao CTN.

O professor HELENO TAVEIRA TORRES, jurista que dispensa maiores apresentações, já esclareceu que:

O Direito Tributário é repleto de mitos e de falsos problemas. Dentre tantos, está aquele de saber se a redução da alíquota a zero é, ou não, equivalente de “isenção”, notadamente para aplicação da regra de segurança jurídica prevista no artigo 178 do Código Tributário Nacional (CTN), que impede a revogação de “isenção” com prazo certo e sob certas condições.

(…)

Os limites entabulados pelo artigo 178 do CTN, bem como a jurisprudência pacífica de nossos tribunais superiores tratam a “alíquota zero” como equivalente de isenção condicionada e com prazo certo, motivo pelo qual seu regime não pode ser revogado abruptamente, ante à proteção dos princípios da segurança jurídica, da boa-fé e da confiança legítima.

(in Isenção e alíquota zero têm idêntica proteção contra mudanças legislativas, 4 de abril de 2.018)

FONTE: https://www.conjur.com.br/2018-abr-04/consultor-tributarioisencao-aliquota-zero-protecao-mudancas-legislativas/

EM PARTE

Assim, nos parece claro que a nova norma criada pelo Governo Federal padece de inúmeros vícios que a tornam ilegal e inconstitucional, devendo haver uma série de questionamentos perante o Poder Judiciário.

Além disso, vale ressaltar o trabalho incessante das entidades representativas do setor, que vem dialogando com os representantes do Poder Legislativo e alertando sobre a verdadeira tragédia que seria a aprovação da medida.

* Alessandro Ragazzi é advogado, sócio da RAGAZZI ADVOCACIA, e especialista em assuntos jurídicos voltados ao setor de ventos, além de diretor jurídico da Associação Brasileira de Cenografia e Estandes (ABRACE)